O estoicismo foi
uma das correntes filosóficas do helenismo mais influentes
na Antiguidade. Essa escola de
pensamento originou-se na cidade grega de Atenas próximo ao ano 300 a.C.,
embora seu fundador, Zenão, tenha sido um estrangeiro natural de Cítio (atual Lárnaca, na ilha
de Chipre). O nome dessa escola originou-se do local em que esse pensador se
reunia com seus discípulos, a saber, um pórtico do espaço público destinado à
discussão política em Atenas — a ágora. Em todas as suas três fases, a
herança socrática é evidenciada.
Características do estoicismo
O aspecto mais
conhecido dessa escola de pensamento é sua perspectiva ética baseada na
indiferença (ataraxia, em grego). Nela a filosofia é entendida como um exercício e não como uma atividade meramente
intelectual. Esses pensadores acreditavam que tudo o que existe estava sob a
determinação de uma força cósmica harmônica e que a virtude
estaria em viver em acordo com o seu desígnio.
Os demais bens
a que o ser humano possa aspirar, como saúde, contentamento e amizade, são
secundários, e não essencialmente bons. De modo semelhante, noções tipicamente
rejeitadas como enfermidade e inimizade devem ser evitadas. A recusa em deixar
levar-se por sentimentos e desejos visa evitar que excessos sejam cometidos e
fins supérfluos sejam valorizados. Só o que é incondicional pode ser
considerado essencialmente bom ou mau. Preservar uma boa reputação é
benéfico, mas não se deve lamentar amargamente sua perda, assim como a inimizade
deve ser evitada, embora sua presença não diminua a felicidade.
O nome
estoicismo vem da palavra grega stoa, que significa pórtico, um
corredor coberto e cercado por pilastras.
A causalidade
dos acontecimentos implicaria um determinismo, perante o qual a única atitude
virtuosa seria a aceitação, já que essas causas são externas e independem do
querer. A aceitação do destino seria compatível, contudo, com a vontade de
fazer o bem, já que esta estaria no reino da interioridade. Essa escolha seria
o caminho da felicidade, indicado já por Zenão, uma vez que o importante seria
manter a coerência e não efetivamente atingir um fim externo pelas ações.
Esses
pensadores, especialmente na primeira fase, privilegiaram as sensações
e rejeitaram o aspecto inteligível da teoria platônica. Nem todas as impressões,
contudo, eram verdadeiras. O que chega por meio dos sentidos precisaria ainda
ser aquiescido, podendo ser rejeitado como representação falsa ou conduzir à
suspensão de juízo.
A figura do
sábio esteve presente como um ideal que não foi alcançado por nenhum partidário
do estoicismo. Apenas esse personagem estaria em um estado de felicidade e
alcançaria o conhecimento. As pessoas são apresentadas, em geral, como
vacilantes entre o vício e a virtude, sendo atraídas pelos desejos e
sentimentos e precisando de ajuda para orientarem-se pela razão.
Fases e principais pensadores do estoicismo
Grande parte
do pensamento desses primeiros pensadores encontra-se acessível hoje apenas por
meio de doxografias. Marco Túlio Cícero, pensador e filósofo do final do século
II a.C., e Lúcio Méstrio Plutarco, ensaísta grego que viveu 100 anos depois,
são fontes relevantes, embora adotem uma perspectiva crítica. O pouco que
sabemos sobre a vida desses pensadores é apresentado no famoso Vidas
dos filósofos eminentes, de Diógenes Laércio.
A primeira
fase é marcada pelas reflexões de Zenão em Atenas.
Ele é indicado como autor de mais de 20 livros, incluindo um escrito
nomeado República, no qual defendeu princípios igualitários, e foi
o primeiro a afirmar a tese central da escola: “a vida deve seguir a
natureza”. É sucedido por Cleantes, de Assos, que defendeu
o materialismo, afirmando inclusive que a alma é matéria.
O último
pensador dessa fase é Crísipo de Solos (cidade que se
encontrava na região da atual Turquia), que sistematiza os pensamentos do
fundador dessa corrente filosófica e defende-a de ataques dos membros da
Academia de Platão. É reconhecido por muitos pensadores antigos como um
grande lógico e dedicou-se a estudar a relação
entre proposições e a combater falácias.
A segunda
fase marca a entrada do pensamento estoico em Roma. Esse período
começa, ainda em Atenas, com Diógenes da Babilônia, que é
enviado em uma delegação para Roma em 155 a.C., e Panécio de
Rodes, que retomou alguns temas platônicos e influenciou o
escrito Sobre os deveres, de Cícero.
Possidônio de Apaméia, que viveu provavelmente entre 135 a.C. e 51 a.C., foi
um polímata e acreditava que a alma, como Platão expôs, constaria com
uma parte irracional. Abriu uma escola na ilha de Rodes, a qual foi
frequentada brevemente por Cícero. O grupo de pensadores desse período é
criticado por um retorno a temas platônicos e por ter sofrido influência de
outras escolas de pensamento.
A última
fase é a que consta com maior fonte textual e permite melhor
compreensão dos períodos anteriores; de vertente latina, tem sua origem na
visita diplomática de 155 a.C. Lúcio Aneu Séneca é o principal
pensador estoico romano dessa época. Em seus escritos, enfatiza a falsidade
da resposta emocional aos fatos cotidianos. Entendendo a mente como uma
unidade racional, propôs que essas respostas seriam falhas de raciocínio.
Muitos dos seus escritos foram preservados, entre os mais relevantes
estão: Sobre a brevidade da vida; Sobre a ira; Sobre
a providência; e Sobre a tranquilidade da alma.
Além dos
livros em que expôs seu pensamento estoico, Sêneca escreveu tragédias, como
Medeia e As troianas, e foi um senador elogiado por sua oratória.|1|
Epicteto, filósofo que provavelmente nasceu no ano 55 d.C. e era oriundo de
Frígia (uma região na atual Turquia), havia sido escravo e teria ganho a
liberdade ao resistir apaticamente a uma crueldade feita por seu senhor, evento
no qual teve sua perna quebrada. Esse relato não confirmado reforça a noção
de domínio de si (autarquia, em grego) perante as perturbações
da vida. Suas reflexões foram registradas por Lúcio Flávio Arriano,
seu discípulo, que compilou o famoso Encheiridion de Epicteto, uma
espécie de manual de bolso para enfrentar as dificuldades cotidianas.
O famoso
imperador Marco Aurélio adquire reconhecimento como filósofo e
governante ainda em vida, e seu contato com a filosofia estoica tem origem com
seu tutor, Júnio Rústico. Suas Meditações, texto cujo título
e compilação são póstumos, podem ser entendidas como um registro
pessoal destinado a seu desenvolvimento moral e não como obra voltada
à publicação, o que explica o caráter assistemático dessas reflexões.
Ainda nessa
fase, esses pensadores mantiveram a intuição original de que a filosofia
conduziria a uma forma de viver e não remontaria a um conhecimento teórico.
A necessidade da meditação diária é mencionada, em muitos momentos, nos textos
que chegaram até nós.
Principais citações
Sobre a ira:
“O que é belo
e digno é apresentar-se como defensor de seus pais, filhos, amigos,
concidadãos, conduzido pelo próprio dever, benévolo, ponderado, prudente, não
impulsivo e raivoso. De fato, nenhuma paixão é mais desejosa de vingar-se do
que a ira, e por isso mesmo ela é inábil para vingar-se. Por ser muito
apressada e insana, como em geral toda cupidez, ela própria serve de obstáculo
para aquilo a que se apressa. Assim, nem na paz, nem na guerra, ela jamais foi
um bem.”|1|
Sobre a brevidade da vida:
“O maior
obstáculo à vida é a expectativa, que fica na dependência do amanhã e perde o
momento presente. Tu dispões o que está nas mãos da Fortuna, deixas de lado o
que está nas tuas. Para onde olhas? Para onde te projetas? Tudo o que há de vir
repousa na incerteza. Vive de imediato!”|2|
Encheiridion:
“As coisas não
inquietam os homens, mas as opiniões sobre as coisas. Por exemplo: a morte nada
tem de terrível, ou também a Sócrates teria se afigurado assim, mas é a opinião
a respeito da morte – de que ela é terrível – que é terrível. Então, quando se
nos apresentarem entraves, ou nos inquietarmos, ou nos afligirmos, jamais
consideremos outra coisa a causa, senão nós mesmos – isto é: as nossas próprias
opiniões.”|3|
Meditações:
“Tudo o que
está em acordo contigo está em acordo comigo, ó Cosmos! Nada do que, para ti,
se dá oportunamente ocorre para mim muito cedo ou muito tarde. Tudo que suas
estações produzem, ó Natureza, é fruto para mim.”|4|
A busca pela felicidade
Os partidários
dessa escola de pensamento envolveram-se em muitos embates com outras
escolas do mesmo período, como os céticos, os epicureus e os remanescentes
da academia de Platão. Em uma oposição direta ao epicurismo, recusaram as
paixões ou prazeres como fontes de felicidade e consideraram que essas eram
fontes de agitações que perturbavam a alma.
A tentativa de
adequar-se aos acontecimentos externos para satisfazer um desejo não seria um
meio adequado de buscar a felicidade, por isso a felicidade estaria
relacionada à aceitação do desígnio da determinação harmoniosa dos
acontecimentos e à decisão pela escolha do que é incondicionalmente
bom.
O resultado
dessa decisão não precisaria ser refletido em conquistas exteriores, por isso
muitos desses pensadores foram descritos como pessoas serenas ou com um
espírito firme. Não se trata simplesmente de inibir ou reprimir as reações aos
acontecimentos, mas de autocontrole e escolher sempre o que é
moralmente bom, independentemente das circunstâncias — a paz em meio aos
infortúnios.
Ainda hoje há
filósofos que seguem princípios estoicos e continuam a desenvolver o pensamento
desses filósofos da Antiguidade, como William Irvine, John Sellars e Lawrence
Becker.
Fonte da pesquisa: OLIVEIRA,
Marco. "Estoicismo"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/filosofia/os-estoicos.htm.
Acesso em 04 de maio de 2020.
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