Oração é busca de Deus. Porém,
nem sempre é fácil encontrá-Lo ou reconhecê-Lo entre nós. Deus entra na nossa
história e mistura-se conosco. O Verbo se fez carne de forma muito humilde,
simples e pobre, totalmente despretensiosa. Enquanto as filhas dos nobres
preparavam seus castelos para receber o Messias, Ele preferiu nascer pobre, num
estábulo, desprovido da exuberância e do perfume do palácio dos reis. Assim
foi, e, embora muitos judeus esperassem grandes manifestações na vinda do
Messias, Ele veio discreto e silenciosamente.
Às vezes, não encontramos Deus
porque Ele não se revela como gostaríamos. Ele exige de nós uma total
purificação do nosso ser. Precisamos nos esvaziar para sermos preenchidos pela
Sua força. A exigência da oração é o total desapego, e somente assim somos
inundados por aquela luz especial que possuem apenas os que procuram o rosto de
Deus “com ânsias de amor inflamado”: “Tua face, Senhor, eu busco. Não me
escondas o teu rosto!”.
Minha experiência pessoal revela
– e os outros confirmam –, que o encontro com Deus não é estático, mas
dinâmico, por isso mesmo, sempre novo. Quando pensamos que o encontramos e
“agarramos”, Ele “escapa”, esconde-se e nos deixa num profundo sentido de
desolação. É o caminho da noite que precisamos aprender a trilhar
silenciosamente e a sós, esperando que o Senhor apareça novamente quando lhe
aprouver. A nós cabe gritar e procurar, a Ele cabe responder. A saudade de Deus
é uma doença tão forte, que somente se cura “com Sua
presença e figura”.
Saber esperar
Atualmente, não sabemos esperar.
O mundo da tecnologia gera a impaciência. Queremos que tudo seja “para ontem”,
esquecemos que existe também o amanhã. O saber esperar é uma atitude bíblica.
No caminho da oração, saber esperar o momento de Deus quer dizer que Ele nos
visita quando menos esperamos e que a nós cabe a vigilância, como virtude de
quem sabe que, mais cedo ou mais tarde, Ele virá nos visitar.
Na escola dos profetas e
místicos, aprendemos a virtude da esperança. As demoras de Deus são
pedagógicas. O orante é, antes de mais nada, homem e mulher de esperança, que
não se cansa de bater até que a porta se abra, nem de procurar até que
encontre, nem de pedir até que obtenha o que mais deseja.
Esperar é lançar os olhos além de
todos os pequenos horizontes da vida e crer que o Senhor da história nos prova,
mas não nos abandona. Ele quer que o procuremos com a intensidade da esposa que
busca o seu esposo, como os olhos dos servos que esperam tudo do seu
Senhor. O salmista anima: “Coragem! Espera no Senhor!” (Sl 26). Nessa coragem,
são superados os medos e as incertezas da fé. A esperança é alimentada pelo
amor. Só espera quem tem fé e quem ama. A vivência das virtudes teologais se
faz indispensável para quem quer se tornar um orante. Deus não se deixa
manipular pelos nossos sentimentos ou exigências humanas; Ele sabe como e
quando vir em nosso socorro.
Ir a Jerusalém
A Palavra de Deus sempre nos
ensina o caminho da oração. Na vivência da Palavra e na sua meditação,
encontramos o caminho que devemos seguir para encontrar o Senhor. O texto de
Lucas 2,41-50 ajuda-me na busca de Deus. Sempre encontro o Senhor em Jerusalém,
na “cidade santa”, que não fica em determinado lugar, mas no coração de cada um
de nós.
Somos a nova Jerusalém, para onde
devemos ir todos os dias para estar com o Senhor. Ir a Jerusalém quer dizer que
é preciso desinstalar-se, sair de si, romper com todas as formas de comodismo
e, sem medo, enfrentar todas as dificuldades que podem estar no caminho. Quem
se coloca a caminho é movido por um forte ideal. Orar é “subir a Jerusalém”,
tomar uma “determinada determinação”, saber que “vida cômoda e oração não podem combinar”, que somente
o amor pode nos convencer a deixar a vida tranquila do nosso dia a dia e
procurar o Senhor que nos espera para nos amar.
Maria, José e Jesus, todos os
anos, deixavam a tranquilidade de sua casa, em Nazaré, enfrentavam as
dificuldades do caminho, pobreza, cansaço, para irem a Jerusalém prestar a
adoração devida ao Senhor. Um caminho que tem o sabor do êxodo, carregado, sem
dúvida, de dor e cruz. Mas eles sabiam que, no Templo de Jerusalém, o Senhor os
esperava. A leitura silenciosa e meditativa deste texto nos faz compreender
como deve ser o caminho da nossa oração.
Jesus, aos doze anos, no
Templo
“Todos os anos, na festa da
Páscoa, Seus pais iam a Jerusalém. Quando Ele completou doze anos, subiram a
Jerusalém segundo o costume da festa. Acabados os dias de festa, quando
voltaram, o Menino Jesus ficou em Jerusalém, sem que os pais o
percebessem. Pensando que estivesse na caravana, andaram o caminho de um dia e
o procuraram entre os parentes e conhecidos. Não O achando, voltaram a
Jerusalém à procura d’Ele. Três dias depois, encontraram-nO no Templo, sentado
no meio dos doutores, ouvindo e fazendo perguntas. Todos que O escutavam
maravilhavam-se de Sua inteligência e de Suas respostas.
Quando O viram, ficaram
admirados; e Sua Mãe Lhe disse: “Filho, por que agiste assim conosco? Teu pai e
eu, aflitos, te procurávamos”. Ele respondeu-lhes: “Por que me procuráveis? Não
sabíeis que eu devia estar na casa do meu Pai?”. Eles não entenderam o que lhes
dizia. Depois, desceu com eles e foi para Nazaré, e lhes era submisso. Sua Mãe
conservava a lembrança de tudo isso no coração. Jesus crescia em sabedoria,
idade e graça diante de Deus e das pessoas”. Passados os dias da Páscoa,
voltaram.
Coloquemos em evidência alguns
aspectos concretos para a nossa vida de oração
A oração é um momento de alegria,
de Páscoa, de festa, mas não pode durar para sempre. Deus nos chama à
intimidade com Ele, convida-nos a subir a montanha para experimentarmos Sua
presença, ou ao deserto, porque quer falar ao nosso coração no amor e na
solidão, ou nos desperta na noite para dialogar conosco e nos apresentar Seus
projetos. Mas, depois desses momentos de intimidade, Ele quer que voltemos às
nossas atividades e sejamos testemunhas autênticas do Seu amor.
A fidelidade e firmeza do orante
não se provam enquanto ele está orando, mas no cotidiano da vida. É sua maneira
de agir, de falar, de ser que torna visível sua amizade com Deus. É
interessante como, na Bíblia, temos sempre essa atitude da intimidade com Deus,
que dá forças para voltarmos aos nossos compromissos humanos. Cada vez mais
compreendo que entre oração e ação, entre contemplação e atividade não pode
existir “divórcio nem desquite”, mas, ao contrário, uma profunda união. Na
oração, revela-se a nossa atividade, e na atividade se manifesta a
autenticidade da nossa oração.
Maria, José e Jesus não ficaram para
sempre no Templo. Depois da festa da Páscoa, puseram-se novamente a caminho.
Assim, depois de nossos momentos de oração, de retiro e encontro, devemos
voltar ao trabalho. Toda Páscoa, que é domingo, devolve-nos à
“segunda-feira”, que é trabalho e labuta onde devemos procurar ser fermento e
ganhar o pão com o suor da nossa fronte.
O Menino ficou em Jerusalém
“sem que os Seus O notassem”
Essa expressão de Lucas pode nos
ajudar a entender como, embora voltando ao trabalho, devemos permanecer unidos
ao Senhor na oração. A intimidade, a vida na presença de Deus nunca pode ser
interrompida. Quer comamos, bebamos ou façamos outras coisas, sempre devemos
agir em Deus.
Maria e José retomaram o caminho de volta, quem sabe
preocupados com os afazeres que os esperavam em Nazaré, mas Jesus permaneceu em
Jerusalém. Nunca devemos “sair” do clima de contemplação e intimidade. Deus
quer que estejamos, constantemente, unidos a Ele, que não nos separemos do Seu
amor nem da Sua presença. Essa linguagem bíblica nos compromete à vivência
sempre em plena sintonia com o Deus da vida. Os místicos e santos sempre nos
recordam disso. João evangelista, quando diz que “Deus é amor”, convida-nos a
permanecermos n’Ele, porque Ele sempre permanece em nós.
Maria e José não se preocuparam
com Jesus. Pensavam que Ele estivesse com os outros, na caravana que voltava
feliz e cantando de Jerusalém. A Páscoa cria um novo clima de fraternidade,
“caminharam um dia inteiro” despreocupados. Mas, ao entardecer, sentem a
necessidade de se unirem novamente a Jesus. Também nós passamos o dia inteiro
preocupados com tantas coisas, mas, ao cair da noite, sentimos a necessidade de
buscar novamente o Senhor para estar com Ele, para entrar em comunhão, para
experimentar, numa forma mais forte, a presença do Amado, como fizeram Maria e
José, mas nem sempre O encontramos.
Não O tendo encontrado…
A dor da decepção é sempre muito
grande. Essa dor foi experimentada por Maria e José que, buscando Jesus, não O
encontram entre os amigos e parentes. Se eles, que cuidavam tanto de Jesus,
estavam sempre presentes em tudo aos desejos e ao cuidado de Jesus, perderam-nO
de vista, tanto mais isso pode acontecer com cada um de nós. Podemos buscar
Jesus e não O encontrar, pedir que outros nos ajudem e ninguém saber nos
ajudar. Podemos viver momentos de desnorteamento nesta procura de Jesus. A
experiência humana da nossa fragilidade nos faz sentir impotentes
e tristes. Nem sempre encontramos Jesus onde “esperamos que Ele esteja”. Mas,
graças a esta perda de Jesus, a Bíblia nos oferece o segredo onde devemos
voltar a encontrá-Lo, onde Ele sempre nos espera.
Voltaram a Jerusalém
Aqui está o verdadeiro segredo da
oração: voltar a Jerusalém. Se nos acontecer, depois de um dia de viagem, de
“perdermos Jesus”, não devemos nos desesperar. Devemos pedir a todos que nos
ajudem a encontrar novamente o Senhor.
Se, no entanto, as criaturas
forem incapazes de nos dizer onde está o Senhor, resta-nos o caminho de volta
para Jerusalém, para o santuário, para o lugar onde o Senhor nos espera. E onde
está Jerusalém? No nosso coração, na Palavra de Deus, na Igreja… Deus jamais desiste de nós, mesmo quando não O
sentimos.
Voltemos a Jerusalém, onde o
Senhor nos espera sempre para novamente entrarmos em comunhão conosco! Ele quer
que saibamos buscá-lo no amor e na fé. Quando o encontramos, Ele desce conosco
para Nazaré, para a vida, e permanece conosco para sempre.
Frei Patrício Sciadini, OCD
Fonte: https://formacao.cancaonova.com/espiritualidade/vida-de-oracao/deus-quer-que-saibamos-busca-lo-no-amor-e-na-fe/
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