Esta é uma interpelante expressão evocada na Carta Encíclica Fratelli Tutti – sobre a fraternidade e a amizade social, do Papa Francisco, em referência à busca por dinâmicas que superem os sombrios sinais de um “mundo fechado”. Não é exagero nem pessimismo: os fechamentos da civilização contemporânea mostram que a humanidade está na contramão de progressos alcançados no campo tecnológico-científico. Torna-se difícil encontrar razões para a atual configuração política, social, econômica e cultural do planeta, com a história dando sinais de regressão. Conflitos anacrônicos – com o surgimento de nacionalismos fechados, ressentidos e agressivos – ressurgem em diferentes lugares. Medidas que buscam superar determinadas ideologias fazem surgir outras igualmente perigosas. Diante desses e de tantos outros problemas, os cidadãos estão desafiados: é necessária lucidez mínima para ir além de interesses político-partidários enraizados em determinadas ideologias. Vencer, assim, os limites de fechamentos obscurantistas e os interesses mercadológicos egoístas – que levam poucos ao enriquecimento enquanto alimentam a exclusão social de muitos, com cenários de desolação agravados pela pandemia da COVID-19. Torna-se inadiável um esforço de todos para que a sociedade adote o paradigma da fraternidade social, por um permanente e fecundo investimento na amizade social.
O Papa Francisco lembra que o bem deve ser conquistado a
cada dia. Não é possível, pois, contentar-se com o que já se obteve no passado
– “muitos dos nossos irmãos ainda sofrem situações de injustiça que nos
interpelam a todos”. Acatar a interpelação que vem dos cenários de injustiças,
violências e desigualdades sociais é contribuir na indispensável e urgente
dinâmica de “abrir-se ao mundo”, mas de modo bem diferente da atual concepção
de um modelo econômico questionável. No âmbito da economia e das finanças, há
uma equivocada compreensão a respeito do que significa “abrir-se ao mundo”.
Essa expressão, no contexto dos interesses econômicos, muitas vezes se
restringe à busca por novos mercados globalizados, visando acúmulo de poder.
Esse exclusivo compromisso com o lucro forma um tipo de cultura que acentua divisões
entre nações e pessoas. Prejudica avanços indispensáveis na promoção da amizade
social, sem a qual não se alcançará a paz no mundo.
Abrir-se ao mundo é tarefa
Cada pessoa deve buscar superar a lógica do mercado que
reduz o ser humano à condição de consumidor ou espectador. A humanidade precisa
reagir a esse “globalismo” que tenta estabelecer uma cultura dominante, com a
valorização da identidade dos mais fortes e a dissolução da identidade dos mais
frágeis – um genocídio cultural. Lamentável é a incapacidade da política para
promover essa reação, pois, cada vez mais, se submete aos poderes econômicos
transnacionais. Sob o controle desses poderes, a política torna-se instrumento
de interesses que propiciam a negociação de tudo, sem escrúpulos. Essa falta de
escrúpulos não raramente tem sido camuflada pela defesa de alguns valores, sacrificando tantos outros que são inegociáveis –
determinantes para reequilibrar a civilização contemporânea.
“Abrir-se ao mundo” na busca pela consolidação da amizade
social é tarefa que exige amadurecimento nos campos antropológico-cultural e da
espiritualidade. O momento atual, consideradas as escaladas de retrocessos,
precisa de líderes e do envolvimento cidadão para que se torne possível
encontrar novas respostas e configurar novos cenários. Nesse processo, uma
situação merece urgente tratamento: os direitos humanos não são suficientemente
universais, não são iguais para todos, e o respeito a esses direitos é condição
básica para o progresso socioeconômico da humanidade. O Papa Francisco sublinha
que o respeito à dignidade e aos direitos humanos fortalece a
criatividade e a audácia, possibilitando que mais pessoas se tornem,
efetivamente, protagonistas na promoção do bem comum. Assim, a cidadania está
desafiada a se fortalecer construindo um mundo que seja para todos. Deve ir
além de paixões, alimentadas por diferentes ideologias, para efetivar uma
agenda de diálogo, reflexões e entendimentos. Ao invés de antecipar discussões
partidárias ou idolatrar determinados nomes, o caminho deveria ser o
investimento nas práticas culturais e sociopolíticas capazes de superar o atual
“mundo fechado”, isto é, injusto e desigual.
É tempo de esperança
É hora de inaugurar, indicar e trilhar percursos de
esperança – a esperança que está enraizada profundamente no coração
humano. Seja alimentada a sede por um tempo novo, alicerçado na grandeza
imbatível da amizade social, fecundada pela vitalidade única da fé. Um caminho
para deixar o coração repleto de alegria fraterna e emoldurar os sonhos da
humanidade a partir do compromisso com o bem comum – cada pessoa vivendo e
trabalhando não somente para si, mas para o bem de todos os irmãos e irmãs.
Fontes://formacao.cancaonova.com/atualidade/sociedade/abrir-se-ao-mundo/
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